sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Contrastes


Composição: Ismael Silva

Existe muita tristeza
Na rua da alegria
Existe muita desordem
Na rua da harmonia

Analisando essa estória
Cada vez mais me embaraço
Quanto mais longe do circo
Mais eu encontro palhaço

Cada vez mais me embaraço
Analisando essa estória
Existe muito fracasso
Dcntro do largo da Glória

Analisando essa estória
Cada vez mais me embaraço
Quanto mais longe do circo
Mais eu encontro palhaço



OBS. A composição acima foi regravada por Luiz Melodia no disco Estação Melodia Ao Vivo.

Sobre ausência, saudade e impossível



Lêem-se palavras que deveriam ter sido escritas há duas semanas. Foi quando se sentiu que algo poderia ser dito sobre ausência, saudade e impossível. Naquele instante, o instante primeiro, talvez se pudesse revelar com mais clareza o que se sentia.
Mas não foi assim. Mais importante é que continuou a se sentir que algo poderia ser dito sobre estas três idéias, mesmo porque, paradoxalmente, a primeira delas - a ausência - está há dias presente.
Não se pode dizer o que dá vínculo a ausência e saudade, embora pareça que seja o afeto. Tampouco se diz o lugar da saudade: se está na lembrança, na distância, ou no possível rever.
Só se pode dizer: foram guardados vários pedaços de saudade de ti. Gestos lançaram saudade (no lugar que não se conhece) com minúcia e sutileza. Sair à rua, esquentar o pão, tomar o ônibus, o elevador, esperar o sinal se abrir, caminhar indo, caminhar voltando, pôr um disco, ver o relógio da janela, juntar na cama os travesseiros. As coisas faziam lembrar a ti, e talvez tivessem a ti, ao menos no meu vínculo com elas.
Sobre o impossível, parece ser tudo isto de que o homem esteja indo atrás. E se parece realmente tão impossível, fazes meu impossível real.





sábado, 29 de novembro de 2008

Atenção, Intendente!


Um lenitivo para os aflitos. Carnaval está pronto. Falta só botar a escola na rua!

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Breve parágrafo sobre a Cinelândia

Resolveu fazer o caminho de que mais gostava. Não havia nada de especial naquele dia, nem na luz daquele final de tarde. Caminhava com a sensação de que nada iria mudar, mas como se fosse. Veio então uma torpe certeza de que era aquela a praça mais bela de todas, naquele instante. Viu com nitidez suas linhas de beleza injusta. Ao dobrar o Passeio Público, Gandhi seguia seu passo, cabisbaixo e gentil. Gandhi talvez não ande mais - está à espera de andar. Viu então rostos ante os gradis do parque. Viu rostos. Solvitur ambulando.

domingo, 26 de outubro de 2008

O homem de 24 anos soluçou

Na janela, precipitando o fim do telefonema
Pelo princípio do transe
Rompeu-se em lágrimas
Cerrou-se no quarto e
Logo seu corpo grande inclinara-se
Sacudindo em espasmos brutos
A dor que o envergara

Do alto de seus vinte e quatro anos,
Do alto da plena juventude,
Do alto de seu quarto no sexto andar,
Aquele homem chorou.

Pranto desses que vêm em soluços,
Transfiguram o rosto,
Desses que apavoram, dão agonia em quem vê
Mas ninguém viu.
Foi egoísta até nisso.

Ficou horrendo, lastimável
Com toda força que cabia em si
Para soluçar

Com medo e com prazer
Correu ao banho, meteu-se em água fria
Onde sentia as lágrimas molhar
Ora soluço, ora choro,
Viu a vez de se enxugar





terça-feira, 21 de outubro de 2008

Viagens à casa




Pensar incomoda como
andar à chuva
Quando o vento cresce e
parece que chove mais.

Fernando Pessoa

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Oh, belle Marcelle


Elle n'est pas Marcelline Loridan
Sans espoir, sans concert
Sans recommencement, sans raison
Sans connaître, sans rancoeur
Maintenant dans l'arrondissement
C'est triste la vue d'un voyer
Et ne sont vrais pas les Cahiers du Cinéma

Amanhã, é carinho, é lágrima
Gota doce
Je t'aime

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Sacolas de compras

Atravessou a Avenida apressado, feito trote. O sinal fechou na hora exata; ele correu para aproveitar a grande oportunidade de se atrasar menos. Era também que as sacolas pesavam muito, por causa das latas de cerveja, da garrafa de vinho, do pote de palmito e da água sanitária: os braços doíam. Chegou à calçada do outro lado, passou pela velha que dorme sob a marquise e parou alguns metros adiante. Pousou as sacolas todas no chão para descansar. Pensou que iam ficar sujas da rua. Pensou que iam sujar o mundo todo. Eram muitas sacolas, assim aos pares, uma dentro da outra. Qual seria o jeito de que as sacolas sujas não sujassem o mundo, se eram tantas e no supermercado havia tantas mais? Numa delas, havia alguns pacotes de pão. Tirou o de pão-de-forma, fatias insossas, entregou-o à velha e seguiu com seu trote ridículo.






Rio de Janeiro, dezembro de 2006




Preparando...



Outros Carnavais: INFANTES DA PIEDADE vem aí!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Trancrições noturnas #01


"Era todavía demasiado joven para saber que la memoria del corazón elimina los malos recuerdos y magnifica los buenos, y que gracias a ese artificio logramos sobrellevar el pasado. Pero cuando volvió a ver desde la baranda del barco el promontorio blanco del barrio colonial, los gallinazos inmóviles sobre los tejados, las ropas de pobres tendidas a secar en los balcones, sólo entonces comprendió hasta qué punto había sido una víctima fácil de las trampas caritativas de la nostalgia".

El Amor en Los Tiempos del Cólera. Gabriel García Marquez

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Em resposta à vendo passar ela



Amor-morto.

Não foi o vermelho que expirou
A tragédia cedeu lugar à pressa
E o real contaminou a graça.
E o amor, este sim, mudou
A morte de amor, morreu
Os olhos dos amantes
Se encheram de preguiça
E a dor não mata mais.
Assim.


Os livros que tratam dos amores dilacerados
Que se dilacerem eles próprios
Ou que ardam – na brasa do sol!
Mudem de nome as criaturas
De um poeta inglês
E se criem novos heróis à maneira nova
Que secam lágrimas ao calor úmido.
Quando choram.


As amêndoas amargas de linhas colombianas
Não exalam seu perfume como dantes
Remetendo aos desejos sem ventura.
Tudo se arruma.
E a dor vem sim como um remédio
Que só no íntimo – e no gosto –
Remete às amêndoas.


Amor-novo.
De um novo entender o sol
E o frescor, o frescor raro.
À maneira nova, serão levados
Os amores – com e sem ventura!


Se a um tempo não se morre, se passa
Ao que se pode ver a extrema graça
De morrer
Um pouquinho de amor


Naquela manhã de fevereiro,
Restaram o sol e os confetes na sarjeta.
E a praça, a praça
continuava ali.


(Ao amigo Rodolfo, que me deu a forma desta poesia.
E a elas, elas que passam.)

22 de fevereiro de 2007

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

A primeira noite de um homem

Criou-se. Não sei quantas linhas serão escritas, quantas imagens serão referidas, por quantas pessoas será lido, ou visto. Mas está criado. É a primeira noite de um homem com seu blog. Tudo aconteceu ao som de Sleeping by Her Side, do disco John Mayall & The Bluesbreakers - Live: 1969.